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sábado, 31 de janeiro de 2009

ZOOLOGIA DA MULHER

"Design perfeito a mulher é o mais avançado dos animais: essa é a teoria do zoólogo que investigou como a evolução moldou, da cabeça aos pés, essa criatura fantásticaPor Marcos Nogueira

O inglês Desmond Morris trata as mulheres como animais. Isso não deve ser tomado por ofensa: ele é um zoólogo e estuda o primata Homo sapiens como mais uma espécie. A mais sofisticada das espécies, que fique claro - cujos indivíduos do sexo feminino são ainda superiores aos machos. Essa é a premissa de A Mulher Nua, livro mais recente do pesquisador. Nele, Morris examina o corpo feminino - literalmente da cabeça aos pés - para defender a tese de que a mulher é, em suas próprias palavras, "o mais extraordinário organismo existente no planeta".

O autor - famoso pelo best seller O Macaco Nu, em que fez uma análise zoológica do animal humano - atribui o sucesso de nossa espécie a um processo evolucionário chamado neotenia. Ou seja: a manutenção de características infantis na idade adulta. Diferentemente dos outros animais, não paramos de brincar quando crescemos. "Adultos, os homens dão nomes diferentes a essa brincadeira: chamam-na de arte ou pesquisa, música ou poesia", afirma Morris.

A neotenia se manifesta de formas diferentes no homem e na mulher. Enquanto ele é mais infantil no comportamento - conserva mais o elemento de risco da brincadeira -, ela incorpora mais características de criança ao corpo adulto. Assim, a fêmea seria anatomicamente mais evoluída que o macho.

A vantagem de um corpinho de criança é clara. A evolução programou o macho para defender a prole - e, no mundo primitivo, a mulher infantilizada também era protegida. Assim, ela preservou a voz aguda, o rosto imberbe, as formas curvilíneas. Mas a neotenia é só uma das artimanhas evolutivas que moldaram o corpo feminino: vire a página para explorar cada pedacinho da mulher nua.

CABELOS - Quanto mais finos os cabelos, mais femininos. Segundo Morris, a cabeleira delicada das mulheres é uma das reminiscências infantis que atraem os homens. Loiras têm os fios mais finos, seguidas pelas morenas e, por último, as ruivas. "Nesse sentido, as loiras são mais femininas", escreve o zoólogo, também responsável pelo negrito no verbo. Aí estaria a raiz da preferência masculina pelas platinadas - e do costume feminino de clarear os cabelos. A tintura não deixa os fios mais delgados, mas o efeito visual é o mesmo. E, no caso, parecer mais feminina já basta.

NARIZ - A infantilização do corpo também explica, segundo Morris, a ocorrência de narizes pequenos nas mulheres - posto que bebês têm apenas um botãozinho no meio da face. Mas ela não seria a única razão. De acordo com o autor, o nariz humano (o único protuberante entre os grandes primatas) funciona como um ar-condicionado que fornece umidade e retém o pó da atmosfera. Nos tempos primitivos, os machos caçadores precisavam de um "aparelho" mais potente - portanto maior - para ter fôlego em suas expedições na savana poeirenta. As fêmeas, que ficavam em casa, desenvolveram menos o nariz. É claro que as dimensões variam de acordo com a linhagem genética. No Ocidente, são raras as mulheres narigudas que estão confortáveis com esse atributo - isso explica a grande ocorrência de cirurgias de redução de nariz.

BOCHECHAS - A ausência de barba é um dos sinais mais visíveis da distinção de gênero entre humanos. Se a mulher nunca chega a ter um rosto peludo, é para manter a aparência de criança que precisa de proteção. "Simbolicamente, a bochecha é a parte mais suave de todo o corpo feminino", diz Desmond Morris. Segundo o autor, bochechas coradas remetem à idéia de virgindade. "A mulher que cora diante de um comentário de conotação sexual obviamente tem consciência de sua sexualidade, mas ainda preserva uma certa ignorância." Mulheres assim geralmente são jovens: eis por que a maquiagem facial muitas vezes carrega em tons rosados nas bochechas.

LÁBIOS - No reino animal, os lábios humanos são os únicos curvados para fora. "Se observarmos atentamente a boca de um chimpanzé ou de um gorila, logo veremos que a superfície macia e brilhante fica escondida", afirma Morris. Nossos beiços não são apenas infantis, são embrionários: eles têm a forma dos lábios de um feto de chimpanzé de 16 semanas. Essa característica se mostra bastante útil para sugar o leite dos seios também exclusivos da fêmea humana. Num homem adulto, os lábios se tornam um pouco mais esticados e finos; mas a mulher, até chegar à velhice, mantém lábios carnudos e macios, prontos para serem beijados. A conotação sexual da boca vem de outros lábios femininos, os lábios vaginais: a semelhança está na forma, na textura e na coloração. E todos os lábios da mulher agem em uníssono quando vem a excitação: ficam mais túrgidos, mais rubros e mais sensíveis. As mulheres não demoraram para perceber essa relação e usá-la em seu favor - o primeiro esboço de um batom vermelho surgiu já entre as prostitutas do antigo Egito.

PESCOÇO - O pescoço feminino é mais longo e delgado que o masculino - decorrência do tórax mais curto das mulheres e da compleição mais musculosa dos homens. De qualquer forma, pescoços esguios sempre foram interpretados como um sinal de feminilidade. Essa característica é levada a extremos em algumas sociedades tribais. As mulheres Padang, da Birmânia, esticam seus pescoços desde pequenas com aros de metal. São as chamadas mulheres-girafa, que na idade adulta chegam a ter 32 anéis, somando até 30 quilos, em pescoços que atingem inacreditáveis 40 cm de comprimento. Imagina-se que, se forem removidos os aros, um pescoço assim não conseguiria suportar o peso da cabeça. Até hoje, ninguém se arriscou a fazer isso.

MÃOS - Aqui se encontra uma das maiores diferenças anatômicas entre os sexos. Enquanto as mãos dos homens são fortes, as das mulheres ganham em flexibilidade. Isso se traduz em maior habilidade para manipular objetos pequenos. "As mãos masculinas, embora capazes de grande precisão se comparadas às mãos de polegares curtos de outras espécies, não podem competir com as mãos delicadas, ágeis e frágeis da fêmea humana", afirma Morris. Mais uma vez, a bifurcação evolutiva tem origem na antiga divisão de tarefas: enquanto os machos caçavam e lutavam com suas mãos musculosas, as fêmeas se dedicavam à coleta de alimentos e a trabalhos decorativos, tarefas que exigem habilidade dos dedos. Então, por que a maioria dos grandes pianistas são homens? Para Morris, a resposta é óbvia: o teclado do piano foi desenhado para mãos masculinas. "Num teclado ligeiramente menor, mais adequado ao tamanho da mão feminina, a flexibilidade dos dedos faria as mulheres pianistas suplantarem facilmente os homens." Resta saber por que os fabricantes de instrumentos musicais ainda não inventaram tal coisa.

SEIOS - Apesar de serem 2, os seios da mulher são únicos. Além de produzirem leite para a prole, despertam interesse erótico no homem. Isso não ocorre em nenhuma outra espécie - após o período da lactação, as tetas das fêmeas simplesmente desaparecem. Nas mulheres, não: as mamas até aumentam quando estão cheias de leite, mas continuam protuberantes mesmo quando não há nenhum bebê para alimentar. Na opinião de Morris, esses seios perenes são uma artimanha da evolução para estimular a procriação. Eles emulam os sinais sexuais emitidos pelas nádegas - algo oportuno para quem assumiu a postura ereta e é quase sempre vista de frente. "O par de falsas nádegas no peito permite continuar transmitindo o primitivo sinal sexual sem dar as costas ao interlocutor", diz o zoólogo. Não à toa, tanto os seios quanto as nádegas têm a forma de meia-esfera. Morris afirma ainda que essa função sexual dos seios pode ter prejudicado sua atribuição primária. "Os seios cresceram tanto em seu esforço para imitar as nádegas que ficou difícil para um bebê abocanhar um mamilo", diz.

CINTURA - A razão por que homens são atraídos por fêmeas de cintura fina é tão simples quanto cruel: depois do primeiro parto, essa parte do corpo se expande irremediavelmente. "Mesmo que ela consiga, com um regime alimentar rigoroso, recuperar o corpo esbelto que tinha antes da gravidez, a cintura nunca vai ser tão fina", afirma Morris. Segundo ele, depois de vários partos, a circunferência da cintura da mulher aumenta de 15 a 20 cm. Portanto, uma cintura de pilão dá ao homem a impressão de estar diante de uma fêmea que ainda não desempenhou sua função de reprodutora - o que, em tempos primitivos, significava quase o mesmo que uma mulher virgem.

QUADRIS - Quadris largos são uma das marcas mais características da silhueta feminina. O sinal biológico que eles transmitem, e que atrai os machos da espécie, é bastante claro: uma bacia ampla facilita a procriação. Mulheres de quadris grandes, então, são imediatamente relacionadas às noções de fecundidade e feminilidade.

PÊLOS PÚBICOS - Fora a cabeça e as axilas, a região genital é a única parte do corpo feminino a ter cabelo abundante. Em primeiro lugar, os pêlos púbicos são um sinal visual. "Numa época primitiva em que os humanos andavam nus, eles devem ter funcionado como um sinal de que a menina havia se tornado uma mulher adulta", afirma Desmond Morris. O nascimento desses pêlos coincide com o início da ovulação - quando a fêmea é biologicamente capaz de procriar. Segundo Morris, "para o macho pré-histórico, a ausência de pêlos púbicos nas meninas era um aviso de que elas ainda eram jovens demais". Esses cabelos têm também a função de atrair o homem pelo odor. Não faz muito sentido num ambiente em que as pessoas usam roupas e tomam banhos diários, mas o tufo de pêlos ajuda a reter os feromônios - substâncias que supostamente despertam a libido - secretados por glândulas da região genital. Há ainda outro motivo para a zona púbica ser cabeluda: os tufos atuam como amortecedor do atrito em atos sexuais, digamos, vigorosos.

GENITAIS - Comparada ao aparelho de nossos parentes mais próximos - os símios - a genitália da fêmea humana apresenta uma sensacional evolução: a capacidade de gerar prazer. Usemos como exemplo o coito entre 2 babuínos: o pênis entra e sai em média 6 vezes da vulva, numa performance que não costuma durar mais de 8 segundos. A macaca não tem tempo nem de pensar num orgasmo. Se a coisa é diferente na nossa espécie, isso não se deve apenas à extrema sensibilidade dos tecidos dos genitais femininos - algumas peculiaridades do pênis humano também ajudam. Macacos não conhecem o que chamamos de ereção: seus pênis são finos e sustentados por ossos. Já o aparato desossado dos homens fica pronto para o uso somente quando a excitação manda para lá um suprimento extra de sangue. Isso alonga o pênis, mas é o aumento do calibre que realmente faz a diferença. A pressão do pênis nas paredes internas da vagina provoca sensações de prazer e, à medida que a excitação cresce, crescem também os lábios vaginais e a sensibilidade de todo o aparelho genital. O clímax de tudo isso é o orgasmo. Bonito, não?

BUNDA - Dentre todos os animais, os humanos são os únicos dotados de bunda. Isso porque também somos os únicos mamíferos a andar sobre 2 patas o tempo todo - os fortes músculos glúteos são essenciais para que possamos adotar essa postura. Em especial nas mulheres, as nádegas exercem também um forte apelo sexual. A bunda feminina difere da masculina em 3 pontos essenciais: é maior, mais empinada e rebola. Não é preciso dizer o quanto essas qualidades agradam ao homem. Não se sabe ao certo por que, mas Morris levanta uma hipótese: como nossos ancestrais andavam de 4 e sempre copulavam por trás, os sinais sexuais eram naturalmente emitidos pelo traseiro da fêmea. Quando assumimos a postura ereta e desenvolvemos os músculos glúteos, as formas arredondadas das nádegas substituíram esses sinais primitivos. "As mulheres com grandes traseiros enviavam fortes sinais sexuais, e com isso as nádegas iam crescendo", diz o autor. Segundo ele, as mulheres passaram a ter superbundas, gigantes a ponto de atrapalhar a cópula - o que teria propiciado o nascimento do coito frontal e o surgimento dos seios como sinal sexual alternativo na frente do corpo feminino.

PERNAS - A atração dos homens por pernas femininas é tão grande que existem revistas especializadas em atender à demanda por esse tipo de fetiche. A principal razão disso é geométrica: ao olhar segmentos de pernas, um homem não consegue evitar imaginar o vértice, o ponto em que elas se encontram. "É quase como se, no recesso na mente do homem, o par de pernas funcionasse como uma flecha que indicasse a 'terra prometida'", afirma Desmond Morris. Pernas longas são particularmente queridas pelo imaginário masculino por serem um sinal de maturidade sexual: nas mulheres adultas os membros inferiores são, em comparação ao tronco, mais compridos que os das crianças.

PÉS - Como não precisavam percorrer grandes distâncias atrás de caça na pré-história, as mulheres acabaram dotadas de pés menores que os dos homens - mesmo em relação ao seu próprio corpo. Assim, pés pequenos passaram a ser vistos como símbolos de feminilidade. Esse é o motivo de mulheres de comportamento masculinizado serem chamadas de "sapatão" e é também uma fonte de constrangimento para meninas que nascem com pés grandes. Para terem pés considerados femininos, as mulheres têm desde sempre se submetido a torturas. A mutilação de garotas chinesas, que tinham seus pés enfaixados na infância para que parassem de crescer, é só um extremo. Os sapatos estreitos e de salto alto - a elevação do calcanhar faz o pé parecer mais curto - estão aí para provar.

PARA SABER MAIS A Mulher Nua - Um Estudo do Corpo Feminino, Desmond Morris, Globo, 2005 Publicado na Edição 215 - 07/2005 da SUPERINTERESSANTE

Do Velho ao Novo

Sexta-feira, 31 de Outubro de 2008

Reflectindo a Crise

Oriunda do latim, o termo crise tem a mesma equivalência da palavra vento. Indica, assim, um estágio de alternância, no qual uma vez transcorrido diferencia-se do que costumava ser. Não existe possibilidade de retorno aos antigos padrões.Reflectindo a CriseUma profunda CRISE está instalada em Portugal e no Mundo ocidentalizado. Esta crise global que afecta o Homem e a sua Natureza revelou o valor das “coisas” no planeta Bolsa, onde se brincou com a falácia da probabilidade, atribuindo valias fantasiosas a “não-coisas” controladas pelo vento da ganância. Acordamos agora para a realidade. Um despertar forçado após anos de luta desigual, negociando em valores desumanizados, entregando à “ambição financeira” as rédeas do crescimento das sociedades e da evolução da Pólis. Diz-se que os Gregos inventaram as cidades depois de se aperceberem que os humanos desenvolvem qualidades muito louváveis vivendo em comunidades pacíficas. Assim nasceram as Belas Artes, a Matemática, a Filosofia, a Política, o Teatro, a Literatura e até a Ciência. Mas a Política tomou conta de tudo e decretou-se o crescimento económico de entidades privadas como solução dos problemas da comunidade e a gestão por objectivos como seu paradigma. Evoluímos para um sistema mediacrático em que o poder é entregue a quem melhor saiba vender a sua imagem e onde a obra pública é oportunidade de negócio antes de ser benefício real para a comunidade. Um sistema em que os nossas necessidades mais básicas são aproveitadas para discutir um “bom negócio” em que a venda/compra de bens/serviços irá beneficiar “alguém” que não o Estado e seus contribuintes. A pequena corrupção já serve de desculpa para a eficiência ou falta dela. Vale tudo para atingir objectivos porque é assim que se faz nas grandes empresas multi-nacionais e os portugueses têm de ser geridos como empregados de José Sócrates e Companhia, Lda.O modelo escolhido não é original, foi o mesmo que o antigo presidente da Reserva Federal norte-americana, Alan Greenspan. Aquele que reconheceu recentemente, numa audição no Congresso, que falhou na regulação do sistema financeiro. "Cometi um erro ao confiar que o livre mercado pode regular-se a si próprio sem a supervisão da administração", desculpa-se o homem que esteve 18 anos ao comando do dollar americano. O que fazer? Mandamo-lo gozar a sua indemnização milionária para casa e proibimo-lo de jogar Monopólio com os amigos? E aos seus seguidores que ainda estragam isto tudo? Pontapé no traseiro?Seremos todos empregados de uma administração democraticamente eleita que confia mais na iniciativa privada que nas suas próprias estruturas; fomos entregues aos bichos, aos “vampiros” de Zeca Afonso que para comer tudo mentem descaradamente, incutindo a falsa ideia que o bolo ainda chega para todos. Vendedores e consumidores. As ambições dos Portugueses resumem-se a isto. Vendemo-nos como escravos ou idiólatras do Capital, consumindo como modo de vida e determinados a consumir tanto quanto o primo abastado. É o objectivo! Casalinho a trabalhar num callcenter de gestão privada, subcontratação que o Estado chama emprego, ligados à máquina que regista a sua produção e eminente despedimento. Casalinho com quatro empréstimos ao Banco, filhos e cães para sustentar, dois carros para os levar ao emprego. Chega a Crise, é o vento que a transporta sabe-se lá de onde. O casalinho perde o trabalho por causa de uma conta mal feita no Planeta Bolsa. Quem os salva? Na Bolsa os bolsos estão todos vazios.A crise dos valores bolsistas é, também e principalmente, uma crise de valores humanos. De certa forma, a sociedade de consumo exige que sejamos consumidores insaciáveis. A ambição infantil de desejar “todos os brinquedos da loja” tornou-se paradigma da actividade social e motor da supostamente messiânica economia de mercado. Tornámo-nos gestores de objectivos vagos. Objectivo: Diploma e Emprego. Objectivo: Casar e representar uma novela da normalidade. Objectivo: Comprar casa para mais tarde comprar outra maior. Objectivo: Ser promovido e mudar de carro. De objectivo em objectivo sem cuidar das faculdades maiores do ser humano: Sabedoria, Bondade, Sensibilidade e Criatividade.É sintomático que a Filosofia tenha sido atirada para a sarjeta do Ministério da Educação. Não interessa o que sabemos, mas o que conseguimos; a bondade é fraqueza e não coragem; a sensibilidade é desprezada e a criatividade sobrevive castrada de autonomia. O que provoca a crise é a revelação do erro. Como escravos na Caverna de Platão que vêem, pela primeira vez, além do que lhes foi permitido até à data. Avistam todo o Mundo de uma vez e entram em depressão nervosa. Mais tarde os escravos exploram e preocupam-se com aquilo que está no espaço mais próximo. Como fizeram os primeiros humanóides nas planícies africanas. É automático e, em tempos de crise, o instinto animal reclama o seu lugar no córtex pré-frontal. Uma das razões que me leva a escrever sobre os engenheiros vendilhões do templo e não sobre a corrupção e liberdades do povo chinês. A crise, em Portugal, é de valores porque o consumo passou a ter um valor real e os princípios morais desvalorizaram. As horas que passamos longe da família e do nosso habitat natural, trabalhando com o mitológico suor no rosto e goelas apertadas pelo nó britânico da seda Versace, cumprindo tarefas que não representam nada de verdadeiramente importante para o próprio ou sua comunidade. Vidas que não são lição para nenhum filho, nem honra a virtuoso antepassado. É apenas um objectivo atrás de outro, sem dar espaço para viver tudo o resto. O resultado desse trabalho é gasto em bens consumíveis ou voláteis; e por eles se negligencia os filhos e a tranquilidade familiar, prejudica a saúde mental e física, compromete a honestidade interior e exterior. Pouco a pouco, o Tuga se foi transformando em ovelha ordeira e produtiva, peça imprescindível para que a máquina cresça e perdure no tempo, dilatando o fosso e disparidade retributiva entre os muito pobres e os disparatadamente ricos; dado crescente em Portugal já com 20 por cento da população em estado deplorável e a maior diferença entre ordenados mínimos e máximos. O Poder achou que podia aproveitar os piores instintos humanos para fazer uma sociedade livre onde todos se poderiam tornar capitalistas. O mercado deveria regular-se sem interferência e valorizávamos apenas o sabor do vento, apostando sempre e apenas na brisa mais forte. Bolas, não é isso que se quer de um Estado. Ao vento o que é do vento, como fantasias, promessas e castelos no ar. O Estado serve para produzir e fornecer aos seus patrões (eleitores) uma vida onde se possam realizar como indivíduos inteiros e de valor. Assim como os heróis de antigamente, sempre honestos e elegantes. Acredito que existem vários valores para além dos afectados crescimento económico. Haja liberdade, igualdade, fraternidade… Saúde, Educação, Justiça; como mudar isto sem políticos com experiência prática e académica nestas áreas. Acredita-se que os melhores sábios destas disciplinas respeitam valores que os impedem de entrar na Política — “A Grande Porca”, nas palavras do mestre Bordalo. Andam por aí, pelas tascas insultando Voltaire que “para cuidar do jardim” matou D. Quixote e casou com Sancho Pança.Em Portugal, salvo rara excepção, são os bons vendedores se tornam ministros, secretários de Estado, administradores, gestores e assessores-de-porra-nenhuma, vulgo aspones. Sabem parecer confiantes quando apresentam gato por lebre e mentir com um falso esgar de preocupação na cara; são agressivos, enérgicos, autoritários e sorridentes. É o modelo do ser Humano bem sucedido, numa Era em que é necessário ter valores fictícios no bolso para dedicarmo-nos ao incomparável e gratuito sistema de valores intelectuais, emocionais e até espirituais.

André Barreiroshttp://andrebarreiros.bloguepessoal.com

Palavras de Osho

Osho, em "Osho de A a Z - Um Dicionário Espiritual do Aqui e do Agora"

Adormecida em um trem
Posted: 30 Jan 2009 04:50 PM PST

Há alguns dias li uma frase de Jean Paul Sartre. Ele diz que a vida é como uma criança que adormeceu em um trem e é acordada pelo cobrador que deseja checar a passagem, mas a criança não tem passagem e não tem dinheiro para pagá-la.

A criança também não está sabendo para onde está indo, qual é o seu destino e por que ela está no trem. E, por último, mas não menos importante, a criança não pode descobrir, porque em primeiro lugar nunca decidiu estar no trem. Por que ela está lá?

Essa situação está se tornando cada vez mais comum para a mente moderna, porque de algum modo estamos desenraizados e está faltando o sentido. Você simplesmente pergunta: "Por quê? Para onde estou indo?

"Você não sabe para onde está indo e não sabe o motivo de estar no trem. Você não tem passagem e não tem dinheiro para pagá-la e, ainda assim, não pode sair do trem. Tudo parece ser caótico, enlouquecedor.

Isso acontece porque as raízes no amor foram perdidas. As pessoas estão vivendo vidas sem amor, seguindo em frente de qualquer jeito. O que fazer?

Sei que todos um dia se sentem como uma criança em um trem. Mesmo assim, a vida não será um fracasso, porque nesse enorme trem há milhões de pessoas profundamente adormecidas, mas sempre há alguém que está desperto.

A criança pode procurar e encontrar alguém que não esteja dormindo e roncando, alguém que entrou conscientemente no trem, alguém que sabe para onde o trem está indo. Estando nas proximidades dessa pessoa, a criança também aprenderá os meios para ficar mais consciente.

Osho, em "Osho Todos os Dias - 365 Meditações Diárias"

Análisis Político/Social

Articulistas / Opinião
Dirceu Benincá*


Frei Betto fala de ecologia interior e sociopolítica

Dentro das atividades programadas para o terceiro dia (29) do Fórum Social Mundial, em Belém – PA, Frei Betto falou da ecologia interior e diversas questões da ecologia sociopolítica que se constituem em problemas na atualidade. A seguir, apresentamos alguns dos principais tópicos abordados por ele.
Ecologia interior
Com base em seu mais recente livro "O amor fecunda o universo – ecologia e espiritualidade", onde procura reler toda a tradição bíblica sobre a questão ecológica, Frei Betto disse que o corpo humano é uma miniatura de Gaia, o planeta em que vivemos. Nosso respirar é um beijo na boca da natureza, a qual nos dá o oxigênio e recebe o nosso gás carbônico. Chamou a atenção para a geografia do nosso corpo, formado – como a geografia do planeta – por rios, vales, montes, fontes e cavernas.
Adão e Eva são duas palavras hebraicas que significam respectivamente terra e vida. Com isso, a Bíblia quer dizer que a vida humana veio da terra. O universo emergiu há 14 bilhões de anos. Nós emergimos da criação divina e somos constituídos dos mesmos elementos de tudo o que existe no universo. A vida humana apareceu há cerca de oito milhões de anos. Somos um ser natural. Não existe o ser humano de um lado e a natureza de outro. Desse modo, não podemos separar o que jamais existiu separado.
Adiante, Frei Betto afirmou: "Sou um católico que todo dia rezo para que Deus me dê a graça de me converter a ser cristão e que, sendo cristão, eu seja humano. Conheço muitos católicos que não são cristãos e muitos cristãos que não são humanos. Na verdade, não existem valores cristãos ou evangélicos. Existem valores humanos que as tradições religiosas realçam para que criemos juízo. Amar, ter compaixão, ser solidário com o pobre, isso é humano. Não é cristão, budista, judaico ou islâmico".
Todos nós temos duas falhas. A primeira é que fomos feitos com "prazo de validade". A segunda é que temos defeito de fabricação, ao que a Bíblia chama de pecado original. Por isso precisamos uns dos outros para tentar ser cada vez mais humanos. Ser humano é lutar pela plenitude da vida de todos e todas e defender a vida de todo planeta.
Sempre aprendemos que Deus fez com a humanidade duas alianças: uma ética, no Antigo Testamento, com Moisés; e uma amorosa, no Novo Testamento, com Jesus. Falta resgatarmos uma terceira aliança, aquela que Deus fez no Gênesis, a ecológica. Assim, como Jesus disse que todo ser humano é sagrado, todo o planeta é sagrado. Engana-se quem acha que pode fazer preservação ambiental sem fazer luta de libertação dos pobres ou vice-versa. As duas coisas estão sempre unidas.
Ecologia física e social
A água é um bem escasso. De toda água do planeta, só 3% é potável. Desses 3%, 26% estão na Amazônia. O solo amazônico tem pouca profundidade e muitos minérios, como o de Carajás. Se o nível de desmatamento continuar, o futuro da Amazônia será o presente do deserto do Saara. Significa dizer que não vai produzir mais chuva para o Sul e o Norte das Américas.
Entre 1990 e 2006, o cultivo de soja na Amazônia cresceu 18%. Soja não dá sombra, nem água e nem abriga a biodiversidade existente aqui. Em 10 hectares tem mais de 10 mil espécies de vida vegetal e animal. É o milagre da vida sendo destruída pelas grandes empresas. De 1990 a 2006, o rebanho bovino cresceu 11%. Por ano, a Amazônia perde cerca de 20 mil Km² de florestas, o correspondente ao tamanho do Estado de Sergipe. Se o ritmo atual de desmatamento continuar, em 2030 a Amazônia terá perdido em florestas o correspondente a 22 Bélgicas. É um verdadeiro ecocídio.
A cada dia circulam na Amazônia 3.500 caminhões com madeira ilegal. As madeireiras pagam pelo metro cúbico R$ 25, madeira que é vendida na Europa ao valor equivalente a R$ 3.200. O Brasil é o segundo maior exportador mundial de madeira, sendo a maior parte de maneira ilegal.
Nos últimos 37 anos houve, na Amazônia, o desmatamento de 70 milhões de hectares. 70 mil hectares foram ocupados com a criação de gado. Os maiores produtores de carne do Brasil estão nos municípios onde há mais desmatamento. São eles: São Félix do Xingu, Conceição do Araguaia, Marabá, Redenção, Cumaru do Norte, Ourilândia e Palestina do Pará. 62% dos casos de trabalho escravo, no Brasil, ocorrem nestas fazendas.
O Brasil foi a última nação das três Américas a decretar a abolição oficial da escravatura. Somos uma nação miscigenada, o segundo país com maior população negra do mundo. Só a Nigéria tem mais população negra que o Brasil. A escravidão hoje é sofisticada. Funciona na base da promessa de trabalho fácil.
O homem e a mulher são "bichos ferozes". É difícil domesticá-los. Eles matam, mentem, destroem a natureza e não se preocupam com as gerações futuras. Nascemos naturalmente capitalistas e crescemos na escola do capitalismo cada vez mais egoístas.
Somos o único bicho que come fora de hora. Todos os demais comem somente quando têm fome. Nós nos empanturramos porque fomos condicionados a ter hora para comer e não fome para comer. Depois nos queixamos que estamos gordos e com doenças.
Ecologia política
Estamos vivendo um momento único na América Latina, que é a emergência de governos democrático-populares. Há uma coisa nova acontecendo que eu chamo de terceiro período, afirmou Frei Betto. Da história recente da América do Sul, o primeiro período foi o mais trágico. Foi o período da ditadura militar, marcado por muita tortura, assassinatos e desaparecimentos.
Depois veio o ciclo neoliberal. Nossos países foram "redemocratizados" com a presença daquelas figuras "impolutas", "imaculadas", "éticas", como foi o caso de Collor no Brasil, Menem na Argentina, Pérez na Venezuela e Pinochet no Chile. Nunca houve tanta corrupção!
Agora estamos no terceiro período, chamado democrático popular. Há muitas dificuldades, falhas e contradições. Por outro lado se verifica um grande avanço, considerando que todos esses governos que vieram das classes populares não fazem parte das elites tradicionais e, de alguma forma, procuram atender o direito dos pobres. Alguns têm coragem de fazer reformas de estrutura e implementar políticas emancipatórias. Outros, com mais medo dessas reformas, fazem reformas compensatórias.
Para que os governantes possam fazer reformas mais profundas dependem da pressão dos movimentos sociais populares. Frei Betto concluiu dizendo que é muito importante voltar ao trabalho de base e ao fortalecimento dos movimentos populares pelo método de Paulo Freire.
* Dirceu Benincá – Revista Missões
(31.01.2009)